dilmairon@hotmail.com

sábado, 9 de abril de 2016

Tempo de Desvario

Por J.R. Guzzo

Publicado na versão impressa de VEJA

Nunca antes na história deste país houve tantas oportunidades claras de dizer ‘nunca antes na história deste país’. É raro, hoje em dia, que se passem 24 horas seguidas sem que aconteça alguma coisa jamais acontecida antes ─ algo sem precedentes, sem registro anterior, inédito, nunca visto, observado pela primeira vez, e assim por diante. Há também a questão do tempo. Todas essas coisas não acontecem desde a proclamação da República, ou o grito do Ipiranga, ou a assinatura do Tratado de Tordesilhas, ou alguma outra data imensa que se desbota lentamente na escuridão do passado. Para os jornalistas, que têm a vaga obrigação de não repetir demais as palavras que escrevem, é uma chateação. Mas o que se pode fazer? O ‘nunca antes’ é um bicho que não dá trégua a ninguém no Brasil de hoje. Ei-lo outra vez: alguém já viu o maior partido brasileiro, o PMDB, sair por vontade própria de algum governo? Pois foi justamente o que fez na última semana desse funesto mês de março, ao decidir em três minutos, e por unanimidade, abandonar o governo de Dilma Rousseff, do ex-presidente Lula, do PT e dos parasitas pendurados em todos eles ─ mais um passo rumo ao atestado de óbito de governantes reduzidos, por seus próprios desatinos, a um aglomerado que vive em delírio, não governa mais nada e declarou guerra à democracia brasileira.

Só um governo patologicamente ruim conseguiria levar um partido como o PMDB a largar o osso, que roeu em mansa sociedade com Lula, Dilma e o PT desde que foram para o Palácio do Planalto, treze anos e três meses atrás. É mais uma taça na categoria ‘Obras inéditas’, em que tanto vem brilhando. Nunca se roubou tanto dinheiro público no Brasil como nos governos de Lula e de Dilma. Alguém pode citar algum outro? Nunca o país foi administrado com uma incompetência tão desesperada. Para ficar só nos números mais horrorosos e mais recentes, o governo pretende ter um rombo superior a 95 bilhões de reais em suas contas de 2016. Ainda outro dia, no comecinho do ano, tinha uma meta de 60 bilhões de déficit ─ não dobrou a meta, como Dilma gosta, mas tem tempo de sobra para chegar lá até dezembro, caso continue por aí. E a Petrobras? A empresa sagrada da esquerda nacional fechou 2015 com um prejuízo de 35 bilhões de reais, que se somam aos 20 bilhões perdidos em 2014; há também os 40 bilhões torrados em corrupção pura, pelos cálculos da Operação Lava ­Jato. Que outro governo brasileiro destruiu tanto o patrimônio da Petrobras?

Nunca houve uma campanha tão frenética a favor da corrupção como a que se faz agora sob o comando de Lula, e que está à vista de todos com o bombardeio contra as investigações em andamento no Poder Judiciário ─ especialmente contra o juiz Sergio Moro, acusado de nazista, bandido, conspirador decidido a eliminar o estado de direito no Brasil e daí para baixo. Nunca um governo recorreu tanto à cesta das soluções cretinas como o atual; seu último feito, aí, é a tentativa de obter ‘apoio internacional’ contra o impeachment de Dilma e futuros processos penais em que Lula possa ser réu. Nesse caso já não se trata de estupidez ─ é desvario. Cinco minutos depois de tomar posse, um novo governo que venha a substituir Dilma já será reconhecido por todas as nações, salvo, talvez, por uma Venezuela qualquer. É bom não contarem com Cuba: hoje o herói de lá é Barack Obama, não Lula, e o grande projeto cubano é dar-se bem com os Estados Unidos.

Nunca antes, enfim, um grupo político ameaçado de ruína bolou uma estratégia de defesa tão alucinada quanto essa tentativa de barrar o impeachment gritando ‘não vai ter golpe’. Claro que não vai ter. A lei diz que não é golpe; aliás, exige que 342 deputados e 54 senadores votem pelo impeachment. O STF diz que não é golpe ─ escreveu, inclusive, o regulamento a ser seguido no Congresso para a deposição legal de Dilma. Câmara e Senado dizem que não é golpe. A Ordem dos Advogados diz que não é golpe. A deputada Luciana Genro, comandante de um partido descrito como de ‘extrema esquerda’ e que prega o fim do ‘modelo capitalista’ no Brasil, diz que não é golpe. ‘Não estamos numa situação de golpe’, garante Luciana; não vem aí, explica ela, nenhum governo que ‘vá censurar, que vá prender, que vá torturar’. Diz que as ‘castas políticas’ estão tentando uma ‘operação abafa’ na Lava Jato e que Moro ‘não é um fascista’. Para completar, diz que ‘Lula é indefensável’ e ‘está comprometido com os interesses dos megaempresários que saquearam os cofres públicos’. Depois disso, a quem apelar?

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Sua opinião é sempre bem vinda. Comente com moderação.